MARCOS MACEDO, TÉCNICO DE BOXE E COORDENADOR DO PROJETO ESPORTIVO COM INCLUSÃO SOCIAL, FALA SOBRE O ESPORTE E SEU TRABALHO
Marcelo Lapola
Dia 18 de novembro de 1960. Numa luta memorável, Éder Jofre nocauteava o mexicano Eloy Sanchez no 6° assalto e conquistava o título mundial da categoria peso-galo. Muitos ouviram a luta pelo rádio. Enquanto o galinho de ouro, nosso herói mais genuíno, ia ganhando vantagem sobre o mexicano, para delírio da plateia em Los Angeles, aqui no Brasil, mais precisamente na cidade de Pinhal, crescia a certeza um garoto de cerca de 15 anos. O cinturão de ouro ficara ao alcance da poderosa mão direita meses antes, quando Éder venceu Joe Medel numa luta incluída em todas as listas das 10 mais espetaculares de todos os tempos. Já nessa luta, o então estudante do curso técnico agrícola Marcos Macedo já havia percebido que o boxe o havia chamado. “Não é a gente que escolhe o boxe. É ele que nos escolhe”, explica. Hoje técnico do esporte em Rio Claro e coordenador do projeto Boxe com inclusão social faz o flashback para tentar responder a primeira pergunta feita pelos jornalistas Marcelo Lapola e Rodrigo Salles, no Café JC: por quê o boxe? “Há cerca de 52 anos houve algumas situações em minha vida que me levaram de vez para o boxe. Saí de SP e fui para o interior. Descobri de verdade essa minha profissão em Pinhal, na escola agrícola. Essa coisa do Éder Jofre disputar o mundial foi mágica pera mim. Lá em São Paulo a gente via as lutas dele, meu pai adorava. Aquilo teve um significado forte para mim. Sem contar que em Pinhal o trote era meio violento. Quando cheguei lá e o pessoal ficou sabendo que eu praticava boxe, logo de cara comecei a ser respeitado. Os veteranos me olhavam de outra forma”, relembra Macedo. Outros colegas de escola agrícola também se interessaram e um pequeno grupo se formou para treinarem. “Eles me davam o dinheiro e, quando ia para São Paulo, comprava as luvas e trazia. Também nessa época comecei com o judô, karatê e um pouco de capoeira. Hoje olho para trás e percebo que um dos motivos era a defesa pessoal. O esporte me deu essa respeitabilidade”, conta.
CENTRO OLÍMPICO
Anos mais tarde, Macedo já de volta para São Paulo, cursou Educação Física na Universidade de São Paulo (USP). Nessa época, conta, o boxe havia ficado um pouco de lado. “Mas aí apareceu o Luis Carlos Fabri que na própria USP abriu o curso de boxe. Desde essa época percebi que eu era muito bom para treinar, com boa coordenação motora, sem muita propensão à competições. Mas nunca imaginava que ia trabalhar com Boxe profissionalmente”, diz. Depois de formado e casado, Macedo, já aprovado em um concurso público para dar aulas de Educação Física na Zona Leste paulistana, foi convidado por Fabri a auxiliá-lo no Centro Olímpico da capital. “Aí comecei trabalhando com crianças na faixa de pré-adolescência. O tempo passou, o Fabri acabou saindo, e eu fiquei por 14 anos lá”, relembra.
INCLUSÃO
Hoje, Macedo e seus filhos Breno e Leonardo são responsáveis pelos treinamentos de cerca de 30 alunos do projeto de inclusão social pelo boxe e outros 60 na academia que funciona em um dos antigos armazéns da ferrovia. Casado com uma rio-clarense, Macedo veio em definitivo para Rio Claro há sete anos. “Na época, São Paulo já estava muito complicado. Minha esposa já estava aqui trabahando. Ei vinha aos finais de semana. Após uma conversa que tive com o Aldo Demarchi, houve a possibilidade de eu mudar em definitivo para Rio Claro. Nunca pensei que meus filhos fossem também lutar boxe. Coloquei primeiro eles para fazer judô. Senti que iam forçados. Minha filha se destacava mais. Iamos juntos até. Aí veio o Jiu Jitsu. Fomos para a Academia Pessoa treinar com o Homero, a Simone, excelentes professores. Já nessa época eu levava a manopla, e fazíamos um treininho ali. Foi aí que o Homero teve a ideia de abrir turma para boxe. Foi uns seis meses mais ou menos”, relembra. Por conta dos treinos que passou a comandar para uma das guardas municipais, Nazaré Britto, Macedo conta que conheceu o então secretário de segurança Marco Antônio Queiroz. Abriu-se então a possibilidade de fazer ali nos armazéns da ferrovia. Começamos a fazer esse trabalho lá com a Nazaré. Aí a coisa foi se ampliando. Pensei em deixar Breno e o Leonardo durante a semana. Teve um certo impasse, mas acabou dando muito certo. Aí a procurar aumentou. Comecei a trazer meu material e a cobrar para as pessoas praticarem. E abri o projeto social como contrapartida, com a opção de gratuidade para servidores, guardas municipais e pessoas mais carentes”, explica. No ano passado a única medalha de ouro para Rio Claro nos Jogos Abertos foi a do Boxe, com Breno Macedo.
EMOCIONAL
Um dos trabalhos mais delicados quando se treina boxe, segundo Macedo, é cuidar também do emocional do atleta. “É delicado, há uma fronteira tênue em muitos que impede que a pessoa leve a luta para fora do ringue. Então o trabalho é de reforçar para que isso não ocorra. E minha tática é muito simples. Olho para trás e tento pegar alguns exemplos e dificuldades da vida pelos quais passei. Em alguns casos é preciso sim ser um pouco pai”, revela Macedo. Entre os muitos talentos já revelados em Rio Claro, ele cita o jovem Jhonatan Conceição, de apenas 15 anos, hoje integrante da Seleção Brasileira de Boxe, após ter participado de seletiva nacional em São José dos Campos. “Ele começou a trabalhar com a gente com 11 anos. De início vi que ele era diferenciado. Lembro que nessa época eu torcia para que não parasse. Fui lá na escola dele falar com a diretora. Cheguei para ela e perguntei se ele é um bom aluno. Ela balançou a cabeça e me disse ‘o Jhonatan não é bom aluno, ele é o melhor’. Isso foi uma alegria imensa para mim”, conta Macedo diz que um dos técnicos da seleção brasileira de boxe disse que nunca havia visto um atleta olhar e prestar tanta atenção no que se diz e cumprir exatamente todas as instruções que se dá no corner.
DIRIGENTES
No universo do boxe no Brasil, segundo Macedo, o amadorismo dos dirigentes é o principal problema. “Tudo começa no despreparo do dirigente. A Confederação de Boxe mesmo, não tem um projeto concreto para 2016. Trouxeram alguns técnicos cubanos que são meros figurantes. Isso, na hora das competições, traz problemas. Temos bons técnicos aqui, mas somos desprestigiados”, critica. Macedo apesenta uma alternativa de solução para o problema. “O que tem que fazer? Pega um campeonato nacional e seleciona os melhores técnicos. Manda eles para Cuba e cobra uma padronização do trabalho para espalhar para todo o Brasil. É simples”, ressalta. Hoje Macedo conta com o apoio da Secretaria Municipal de Esportes para alguns de seus atletas e também do CTP Gama. “Fico contente de ver que tem mais gente que acredita nesse nosso trabalho. E o boxe tem um forte poder de inclusão social. Isso acontece no mundo todo”, conclui.
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